segunda-feira, 21 de fevereiro de 2011

A vida de um morcego

Em Portugal existem 26 espécies destes mamíferos voadores, que variam muito no tamanho, aparência, comportamento e noutros aspectos da sua biologia.

Os morcegos alimentam-se de insectos, que caçam durante a noite. Algumas espécies capturam insectos voadores, outras conseguem apanhá-los no solo e em rochedos, paredes e plantas ou superfícies de águas calmas. Para poderem capturar estas presas, os morcegos têm um voo extremamente ágil. Ainda que tenham boa visão, durante a noite utilizam principalmente o seu sistema de ecolocação que consiste na localização dos objectos e presas através dos ecos de ultra-sons que emitem pela boca e pelo nariz.
Na Primavera dão à luz uma única cria, que cresce rapidamente. Durante os meses quentes do ano, acumulam grandes quantidades de gordura, que serve de reserva alimentar para o Inverno. Durante o Inverno a maioria dos morcegos hibernam por longos períodos devido à falta de alimento. Este ciclo repete-se ao longo dos cerca de 30 anos que estes pequenos animais chegam a viver. Esta longevidade é surpreendente tendo em conta as suas pequenas dimensões. Os morcegos da nossa fauna variam entre 3 a 10 cm de comprimento.



Algumas espécies abrigam-se quase exclusivamente em grutas, minas e outros subterrâneos. Outras preferem pequenas cavidades nos troncos das árvores, como ninhos de pica-pau abandonados. Há também espécies que se abrigam em casas e igrejas, em geral em salas pouco perturbadas, no forro, na cave, ou em escoaços apertados (entre telhas, etc). Não ocupam em geral o mesmo abrigo ao longo de todo o ano, chegando por isso a fazer migrações com centenas de quilómetros.
 
Os morcegos são olhados como mau presságio e ligados a bruxas e lendas, como a do Conde Drácula. Há também uma crença de que se emaranham nos cabelos. Na verdade, os morcegos são inofensivos e não causam prejuízo. São até muito úteis pois destroem grandes quantidades de insectos, combatendo pragas agrícolas e florestais e vectores de doenças. Numa noite, um morcego pode comer mais do que o seu próprio peso em insectos! O tipo de voo varia com a espécie, correspondendo a diferentes comportamentos de caça.


Tal como no resto da Europa as populações de muitas das nossas espécies têm vindo a diminuir, havendo em Portugal  9 em perigo de extinção. 

A destruição ou perturbação dos vários tipos de abrigos é um dos factores responsáveis pela diminuição das populações de morcegos. O abate de velhas árvores restringe os abrigos disponíveis para as espécies arborícolas. As espécies cavernícolas são as mais afectadas, devido à grande concentração dos indivíduos num número reduzido de abrigos. É por esta razão que a maior parte das espécies cavernícolas está em perigo. Em edifícios, nem sempre são bem recebidos. São mortos ou obrigados a abandonar os seus abrigos. São também afectados por alterações dos habitats e aplicação de pesticidas. Por serem muito úteis e estarem ameaçados os morcegos estão protegidos por lei.  



Conservação
Portugal foi um dos primeiros países europeus a ter um plano de conservação dos morcegos cavernícolas, espécies particularmente ameaçadas. Esta publicação - Palmeirim, JM & Rodrigues L 1992 – Plano Nacional de Conservação dos Morcegos Cavernícolas Estudos de Biologia e Conservação da Natureza 8 será em breve disponibilizada em formato pdf. Está previsto que o plano seja revisto nos próximos anos.
As medidas de conservação já implementadas incluem: (1) inclusão dos abrigos mais importantes na Lista Nacional de Sítios designada para a Rede Natura 2000, (2) programa de monitorização anual dos abrigos de criação e hibernação mais importantes, (3) vedação de cinco abrigos de importância nacional, (4) estabilização do tecto de um abrigo, (5) construção de dois abrigos artificiais para compensar a destruição de duas galerias de minas que albergavam morcegos, (6) corte de vegetação em redor das entradas dos abrigos, e (7) protecção de minas abandonadas compatível com o seu uso continuado pelos morcegos.


Para os observadores:
Pequeno Guia dos morcegos de Portugal - Custa apenas 3,00€


 Adaptado de (Texto de Luisa Rodrigues e Jorge Palmeirim; Ilustrações de Alexandra F. Almeida e Pedro Casaleiro; «Morcegos», uma publicação do ICNB - Instituto da Conservação da Natureza e Biodiversidade)

sexta-feira, 18 de fevereiro de 2011

Pirilampos mágicos

Os pirilampos são insectos pertencentes à ordem Coleoptera, tal como as joaninhas ou os besouros. Uma das características marcantes da morfologia dos pirilampos é o seu dimorfismo sexual: as fêmeas de muitas espécies são ápteras e possuem élitros vestigiais, diferindo claramente dos machos e assemelhando-se às larvas (que não possuem asas nem élitros).


A coloração é geralmente em tons de castanho, mas muitas espécies apresentam cores vivas, nomeadamente no tórax, que pode ser total ou parcialmente vermelho, laranja ou amarelo. A característica mais familiar dos pirilampos não diz respeito, contudo, à morfologia ou à coloração, mas ao facto de todas as larvas e os adultos de grande parte das espécies emitirem luz, tornando-se visíveis ao crepúsculo e início da noite. Esta emissão de luz resulta de uma reacção química na qual uma substância, denominada luciferina, é transformada por acção da enzima luciferase. Trata-se de uma reacção extremamente eficiente que praticamente não envolve a produção de calor, com cerca de 90% da energia a ser convertida em luz visível (numa lâmpada incandescente apenas 10% da energia é transformada em luz). Segundo a teoria mais aceite, as larvas emitem luz para protecção, avisando os predadores de que possuem substâncias químicas nocivas. Por seu turno, os adultos utilizam a luz para atrair e encontrar parceiros e, nalguns casos, para atrair presas (outras espécies de pirilampos). Nas espécies cujos adultos não emitem luz, os parceiros encontram-se através de feromonas.



Conservação
O estatuto de conservação dos pirilampos é actualmente desconhecido em Portugal, devido às lacunas de informação sobre a sua distribuição, ecologia e factores de ameaça, para além do inventário não estar ainda concluído. Como ocorre com todos os seres vivos, a conservação dos pirilampos está intimamente ligada à preservação dos seus habitats. Uma vez que a visualização, pelos machos, da luz emitida pelas fêmeas é essencial para a reprodução de numerosas espécies, as condições de obscuridade natural ao crepúsculo e início da noite constituem também uma característica fundamental do seu habitat. Por essa razão, a poluição luminosa interfere com os movimentos e o comportamento reprodutor através da atracção, pelas fontes de iluminação artificial, dos indivíduos em busca de parceiro, distraindo-os dessa busca e provocando uma redução da eficiência reprodutiva das populações. Outro aspecto fundamental para a sua conservação relaciona-se com o facto de se tratar de predadores especializados em moluscos e minhocas, tendo o uso de pesticidas para controlo de caracóis e lesmas um efeito negativo pela redução da disponibilidade de alimento.


Espécies citadas de Portugal:
- Lampyris (Lampyris) iberica Geisthardt, Figueira, Day & De Cock, 2008
- Lampyris (Lampyris) raymondi Mulsant & Rey, 1859
- Lampyris (Lampyris) noctiluca (Linnaeus, 1767)
- Nyctophila reichii (Jacquelin du Val, 1859)
- Pelania mauritanica (Linnaeus, 1767)
- Lamprohiza paulinoi E. Olivier, 1884
- Lamprohiza mulsantii (Kiesenwetter, 1850)
- Phosphaenopterus metzneri Schaufuss, 1870
- Phosphaenus hemipterus (Goeze, 1777)
- Luciola lusitanica (Charpentier, 1825)

Para o observador:
Nas zonas temperadas, durante o verão, é possível ver pirilampos num período de cerca de duas semanas, especialmente em noites quentes e húmidas.

Nota: Se apanhar um pirilampo, segure-o cautelosamente e solte-o depois de o ter observado/estudado. Estes insectos estão a desaparecer devido à poluição, pelo que devem ser cuidadosamente tratados.  


Adaptação de José Manuel Grosso-Silva, Sónia Ferreira,Pedro Sousa e Patrícia Soares-Vieira (CIBIO-UP)

domingo, 13 de fevereiro de 2011

Tucano - Ramphastos sulfuratus

A região específica desta espécie é essencialmente a América do Sul e América Central. Os tucanos habitam florestas, tais como a Amazónica e a Atlântica. Gostam de viver em selvas tropicais e muitos deles dependem das selvas chuvosas primárias, pelo que a sua sobrevivência está ligada ao destino destas selvas. Os tucanos gostam também de habitar locais onde existam palmeiras (Imagem 1).

Imagem 1 - Tucano no seu habitat natural

Os tucanos, caracterizam-se pelos seus bicos enormes e a sua longevidade pode ir de 10 a 12 anos de idade. Quanto à reprodução, os tucanos são monogâmicos territorialistas (vivem e reproduzem-se em casal isolado). Não há dimorfismo sexual e a sexagem é feita através de DNA. A fêmea e o macho constroem o ninho em cavidades de árvore, porém, como os demais tucanos, não têm o hábito de carregar material para forrar a câmara onde põe os ovos; a própria madeira esfacelada do tronco é utilizada para tal fim. Enquanto a fêmea choca o macho alimenta-a. Na família, cada postura consiste de 2 a 4 ovos brancos, incubados pelo casal, durante cerca de 18 dias.
Os tucanos alimentam-se principalmente de frutos e pequenos vertebrados; capturam cupins em revoada ou então pousados sobre cupinzeiros arborícolas.  

Além de serem frugívoros (comerem fruta), necessitam de um certo nível proteico na dieta, o qual alcançam caçando alguns insectos, pequenas presas (como lagarto, perereca, entre outros) e mesmo ovos de outras aves. 

Esta espécie vive em pares ou em pequenos grupos (entre 5 a 10). Durante as horas de mais calor prefere refugiar-se nas zonas mais densas da floresta mostrando-se mais activo nas horas finais do dia, ao pôr-do-sol. Um dos comportamentos mais interessantes desta ave é as suas diferentes vocalizações. Por exemplo, no início da noite os bandos reúnem-se numa árvore e "cantam" em coro. Muitas das vezes, outro grupo, distante, responde a essas vocalizações. 

Os tucanos têm a zona em volta dos olhos desprovida de penas. Na sua coloração predomina o preto, com zonas de cores intensas.


O bico destas aves é muitas vezes tão grande como o seu próprio corpo, mas as suas paredes são muito finas e é bastante leve, já que o seu interior é ocupado por alvéolos de ar (Imagem 2).

Para além de distinguir a espécie, o bico dos tucanos é uma ferramenta muito prática para poderem chegar aos frutos que crescem na ponta dos ramos muito finos, que não suportariam o peso da ave. Na ponta do bico existem uns dentes como os de uma serra que impedem as frutas de escorregar entre as mandíbulas.

Têm um enorme bico formado de tecido ósseo esponjoso. Por isso, o bico é leve e não cria problemas para o seu equilíbrio. No voo ele é mantido horizontalmente, em linha com o pescoço. Quando o tucano dorme no oco de uma árvore, ele vira completamente a cabeça e descansa o bico nas costas. Não têm um bico muito forte, já que é muito comprido e a alavanca (maxilar) não é suficiente para conferir tal qualidade.

Imagem 2 - Bico de um Tucano adulto

O seu sistema digestivo é extremamente curto, o que explica a sua base alimentar, já que as frutas são facilmente digeridas e absorvidas pelo trato gastrointestinal. Possuem pés zigodáctilos (dois dedos direccionados para frente e dois para trás), típicos de animais que trepam a árvores.

O tucano pode medir de 50 a 60 cm e pesar de 580 a 750g, sendo os machos maiores que as fêmeas, o seu bico pode medir entre 15 a 20 cm (Imagem 3).

Imagem 3 - Exemplar de Tucano adulto

Observações: Espécie em perigo de extinção, devido à perda do habitat, à caça e à armadilhagem.

terça-feira, 8 de fevereiro de 2011

Viúva-negra-mediterrânica

A Latrodectus tredecimguttatus, mais conhecida como viúva-negra-mediterrânica não é propriamente uma espécie comum, mas distribui-se por todo o território de Norte a Sul e do interior ao litoral. É uma espécie de hábitos refundidos pelo que é pouco vista. Nativa da Madeira, nativa de Portugal Continental, habita dunas e areais, matagais, montados localizando-se em locais áridos ou ensolarados, frequentemente com vegetação baixa ou sem vegetação, embora possa surgir em áreas com arbustos mais densos. No solo, prefere ficar debaixo de pedras e em arbustos. Os machos adultos podem ser encontrados em todos os locais quando se deslocam em busca de fêmeas. 


Esta espécie possui uma carapaça negra brilhante. As fêmeas podem fazer até 8 posturas num ano com um número de ovos muito variável entre os 80 e 250 ovos em cada postura. Esta é envolta numa ooteca esférica com cerca de 15mm de diâmetro, de seda branca ou amarelada. As posturas são realizadas normalmente entre Junho e Outubro e o período de incubação é muito variável entre 15 dias a vários meses dependendo das condições de temperatura e da época do ano. As pequenas aranhas atingem a maturidade ao fim de 4 a 12 meses.


As teias têm a estrutura normal da família com um esconderijo, uma teia de captura e um emaranhado de fios de suporte e alarme que podem também servir como fios de captura. O esconderijo é simples e geralmente situa-se perto do solo ou mesmo debaixo de pedras frequentemente disfarçado com restos de presas e outros detritos. A teia de captura pode estar a uns 20 cm de altura desde o solo e dela saem inúmeros fios de suporte, entre os quais alguns directos ao solo com pequenas gotas de seda líquida muito pegajosa que servem para captura de animais que se deslocam no solo.


Esta viúva-negra alimenta-se principalmente de insectos predando com frequência formigas e coleópteros mas pode predar qualquer pequeno animal que passe pela teia como escorpiões, aranhas, centopeias, etc.
A captura é feita com uma seda muito pegajosa e muito forte que cola nas presas com as patas traseiras. Quando a presa começa a ficar enleada, a aranha, eleva-a esticando fios de seda e frequentemente isola-a do resto da teia cortando os fios em redor. Por esta altura tenta procurar uma extremidade como uma pata ou uma antena, se possível, e aplica uma picada com um veneno forte e paralisante. Segue-se um reforço de seda e aguarda que a presa fique atordoada. Só nessa altura se aproxima com mais confiança. esta seda pegajosa é igualmente usada como mecanismo de defesa. Se se sentir perturbada, a aranha lança pequenos jactos de seda que rapidamente se colam e se enleiam no potencial inimigo.

Esta é uma espécie algo tolerante, não sendo particularmente agressiva, no entanto está dotada de um veneno potente quer para as suas presas, quer para os seus potenciais inimigos.
Em caso de picada, o efeito pode ser muito variável e a própria aranha pode injectar quantidades variáveis de veneno. Os efeitos nos insectos são de paralesia, nos seres humanos pode provocar dor intensa, feridas no local da picada, contracção dos músculos, particularmente abdominais (provocando uma situação complicada de rigidez abdominal que, além da dor, dificulta a respiração), faciais (provocando uma expressão característica chamada de facies latrodectismica) e penianos (provocando o priapismo), aceleração cardíaca, hipertensão, oliguria, suores, cãbrias e paralesias parciais temporárias.



Nota: Esta espécie encontra-se na lista de espécies perigosas de Portugal "Espécie com veneno capaz de produzir situações de extremo desconforto ou dor durante períodos de tempo consideráveis" pelo que é completamente desaconselhado o seu manuseio sem as devidas precauções.



Fonte: Adaptado de Naturdata